domingo, 30 de novembro de 2008

A segunda palavra

O que não somos capazes de esquecer? Porque damos importância tão desmedida às palavras quando elas são apenas - e tantas vezes tão somente - uma forma de expressão e comunicação de seres tão erráticos como nós, humanos. A palavra é sim arma virulenta, doída, mas não letal. Sempre existe a possibilidade de uma segunda palavra, uma explicação, quem sabe o perdão. Já me senti tantas vezes profundamente atingida por palavras. Continuo me sentindo assim, mas das coisas que aprendemos com a vida - eu, pelo menos, aprendi - é que não posso me imobilizar por uma palavra cruel sem tentar retirar dela todo o veneno ou o antídoto que ali podem coexistir. Quero explicações, pergunto porquês, me submeto às argumentações, mas preciso sempre tentar. Explicar e me explicar. Ainda que não dê em nada, ainda que eu não resolva, que não me seja oferecido o benefício da explicação, que eu sofra por não me fazer entender ou perdoar, sempre quero a segunda palavra. Quero o lenitivo que me faz do lado de fora das histórias mal resolvidas. Aquelas das quais não podemos mais esquecer.
Estou novamente em fase pouco prolixa. Há quem diga que é o inferno astral dos capricornianos. Confesso que não me deixo tomar por essa teoria conspiratória dos astros, mas não tenho tido vontade de transformar observações e sentimentos em palavras. Quem sabe não as queira nem mesmo como veneno ou antídoto. Mas elas são sempre companheiras solidárias. Se escondem de mim quando não as vejo em sua expressão mais latente. Embora tantas vezes as chame e as use sem limite, exaustivamente.
Hoje, contudo, tive vontade de voltar ao blog e dizer do quanto me entristece ver pessoas a quem quero tão bem aprisionadas pela força de uma palavra mal colocada, uma frase perdida, errática, absolutamente humana. Não consigo compreender a impossibilidade do perdão. Não posso aceitar que não sejamos veículo de compreensão se temos o fantástico poder da segunda palavra.
Quero crer que nos cabe esse bem e esse uso. Pelo menos para que possamos dizer, ainda que para nós mesmos, que a tentativa foi feita.
Afinal, o que será que não podemos esquecer?

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Noite de furacão

Sim...não acredito em meia vida, meio mergulho, meia entrega. Sou vento em noite de furacão. Derrubo telhas, arranco portas, levanto tampas de bueiro...até tropeço e caio tantas vezes. Mas é bom demais voar ao sabor do vento forte. Às vezes me assusto, tenho medo e vontade de me esconder entre frestas. Mas sei que ali não há lugar para mim. Quero muito da vida, preciso de gente, de espaço e de luz. Acredito em constelações e sonho com o vôo por sobre as estrelas. O combustível para essa viagem está também nas pessoas que arregimento para o trajeto. Gosto disso. De dividir olhares sobre o que vemos. Porque não há um saber maior sobre o saber de todos. Amo a idéia da conquista, mas sou muito melhor quando somo e divido. Entre todos.

( quer saber??? nem sempre dá certo; às vezes estou absolutamente decepcionada e descrente. ainda bem que dura pouco. e que logo volto ao meu norte desencanado e crédulo. ainda bem)

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Invento histórias

Outro dia, respondendo a um desafio da Joice Worm, do blog O Pequeno Milagre, fiz um acróstico e postei como comentário. Gostei da experiência. Jamais tinha feito; sequer tinha pensado em fazê-lo. E mais curioso ainda é que o fiz instantaneamente, sem me preocupar com forma; apenas com a obrigatoriedade de iniciar as frases com as letras do meu nome. Incrível foi perceber - e por isso reproduzo o acróstico aqui e até conto essa história - que a primeira palavra que veio à minha cabeça e iniciada com o "v" foi "verdade". Dali imediatamente completei: verdade que invento histórias. Porque é isso mesmo que sou: uma contadora e criadora de histórias, que se confundem de tal forma comigo, com minha vida, sonhos e delírios, que não sei mais de quem falo quando penso; de quem penso quando escrevo. Verdade que invento histórias. Essa também.

Verdade que invento histórias
E minto que vejo o que mora em mim
Rio ao reler o que escrevo
Olhar incrédulo sobre o que vi
Nada, contudo, parece estranho
Infinitamente próximo e real
Chego a pensar que sonhei
A vida, Verônica , é surpresa também.

( O desafio era da Joice. Mas quem quiser sentir-se desafiado, aí está!!!)

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Agora já era!!

Pronto...já era!!! Viramos adultos e tudo o que queremos é alguém que nos acuda, dissipe o que nos assusta, destrua o dragão que insiste em nos fustigar com labaredas incandescentes. Um super-herói indestrutível, a quem recorremos quando o trem por sobre a ponte insiste em tombar. Não importa se não verificamos os freios, se sequer conferimos a firmeza da ponte. Queremos que o mais forte ouça nossos apelos e venha em nosso auxílio.
Estamos todos boa parte de nossas vidas embaixo das mesas, escondidos das travessuras que fizemos, mas com os pés de fora. Qualquer um vê, mas brincamos de esconde-esconde e até nos convencemos de que o que passa em nossa cabeça é apenas o “making-off” da vida do vizinho.
Somos crianças vestidas de gente grande, de corpo avantajado e mente compulsoriamente madura. Não...não foi escolha, foi contingência.
E agora...já era!!! Não posso sentar na beira da calçada, chorar e chamar por minha mãe. Meus pensamentos antes delirantes viraram pensamentos pouco nobres. Quero sonhar e viver o sonho cotidianamente. Fazer da jabuticabeira meu quartel-general; da caixa de fósforos, um walkie-talkie poderoso; da bicicleta, minha nave “enterprise”.
Mas...já era!!! Estamos navegando em barquinhos de papel ao sabor do mar revolto. E os coletes salva-vidas furaram todos. Na ausência da fantástica escada que nos leva ao mundo maravilhoso de Alice, temos que vestir a capa da visibilidade e encarar. Com todas as encucações, pirações e devaneios que nos acompanham. Se isso significa olhar o espelho e não encontrar um mago a nos dizer de nossa incrível beleza e perfeição, que seja. Agora, meu irmão, já era!!!

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Um encontro sempre emblemático

Adoro mãos! Especialmente o toque de mãos! Não há gesto mais intenso, emblemático e revelador. Posso - e muitas vezes o faço - me jogar superficialmente em gestos de carinho ou mesmo automáticos como o beijo no rosto de alguém que encontro, um abraço fugidio, a mão no ombro, o afago efêmero. Mas quando minhas mãos se encontram com outras mãos - além, é claro, do aperto simbólico de apresentação formal - faz-se mágica. Lembro de João, meu filho, a beliscar-me a parte de cima das mãos e a fazer deste gesto a certeza da minha presença. Recordo Ana Luiza, minha pequena grande filhota, a repetir sempre: "Quero segurar a mão da mamãe!" Caminhos percorridos, ruas atravessadas, o símbolo da segurança expressa em afeto e troca cármica. A mão firme de Carlos, eternamente ao alcance das minhas. A mão frágil de minha mãe, a pedir e dividir.
Dos amigos de verdade, no tempo em que a verdade pode ser contada, conheço e reconheço as mãos. E as seguro e afago, desobstruindo o percurso de dias eventualmente difíceis, compartilhando o calor emanado nos dias de êxtase e prazer.
Minhas digitais estão espalhadas por aí, muito além dos registros oficiais expressos em RGs ou passaportes. E também estou repleta delas porque são as marcas que realmente importam ou que levo comigo, herança exposta que não cabe nem pode aprisionar-se em cofres secretos.
Gosto de mãos, gosto de gente, gosto de afeto e história. Tudo ao mesmo tempo. Agora

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Só sei

O pulo me cerca
E seca a cerca que cerquei em mim
Mas salto o cerco e me arranho
Arranco o rastro que rasga o rio,
rompendo ruas, risos, rusgas que percorri.
Cerco o muro que seca o pulo.
E salto...
Só sei do solo que sombreia,
só sei do sol,
só sei de mim.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Confrontos e conflitos

É verdade! Adoro um confronto. De idéias, de palavras, de emoções...Fora os momentos de silêncio ( que são poucos), nos demais gosto demais do debate, especialmente com os que pensam diferente, vivem a vida por outros caminhos que ainda não experimentei, que quebram minha métrica e me oferecem a possibilidade de um enfrentamento adrenalizante.
Isso nada tem a ver com conflito. A indisponibilidade de olhar por outro ângulo, as amarras cruéis às escolhas das quais não se tem nem mesmo certeza, a intepretação antolhada e reduzida de cada palavra, cada gesto, cada caminho escolhido, o desrespeito, o desamor, a descrença que impede a evolução e o crescimento....esses sim são fontes de conflito.
Não gosto de conflitos. Gosto demais do estado latente, daquela coisa que é viver respirando literalmente por todos os poros, faces, cantos, sinais, cores e equívocos de que somos compostos.
Tenho medo, sim. Insegurança, também. Recuos e avanços, muitas vezes. Reflexões imensas, quase sempre. E é bom logo avisar: gosto da vida intensa, do confronto, da adrenalina, mas discuto relação sempre. Sou DR até mesmo com os amigos.
Pensei em tudo isso hoje e depois de um longo tempo sem vontade de escrever ( no blog, é claro, porque tenho que fazê-lo, profissional e cotidianamente), vivendo alguns conflitos no trabalho, mas deliciosos confrontos, me sinto inteira pro fim de semana.
Nem acho que vai fazer sol no Rio, mas me sinto especialmente clara, diurna, de olhar e mente aguçados para ser o que sempre sou: uma errante otimista. Bom...nem tão errante assim.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Legítimo

Nessa tarde chuvosa de domingo leio o livro de crônicas da Martha Medeiros - Doidas e Santas - e em um dos textos ela lembra dos dias em que não estamos para festa. Tudo corre em seu ritmo normal, mas os fatos de sempre ou os novos, um acontecimento, um olhar, a força das palavras, a expectativa ou a ausência que elas nos trazem ganham uma dimensão que nos empurra para a tristeza. A isso Martha define como " um sentimento tão legítimo como a alegria". E lembra: "...que nos deixem quietos que quietude é armazenamento de força e sabedoria....daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta".
Me identifico muito com essa descrição. Porque hoje, agora, nesse minuto, me sinto triste e quero a quietude. Para pensar justamente no que me entristece, ainda que sabendo que amanhã carregarei comigo o viço da crença do novo dia. Como o cheiro do mar que quebra na praia nas manhãs sem sol. Gostoso, inspirador, quase um parto que traz consigo o sorriso dos que acompanham aquela chegada.
Porque quero pensar em chegada e esquecer as partidas. Porque quero ver minha mãe tão frágil e só pensar em compartilhar mais e mais de todo o tempo bom e rico que, juntas, me permitirão fazê-la acarinhada. Porque minha vida também está registrada naquela pequenina figura a lembrar de mim como quem cuida e roga. Como quem oferece e solicita. Como quem chega e parte.
Minha mãe... meus filhos...hoje só quero tê-los todos no meu colo e ninar com a mais harmoniosa cantiga. E dizer de amor e falar de doce e canção; e lembrar de versos e bolas de gás; de amarelinha e purê de batata. Das noites de natal e velas de aniversário.
É só uma melancolia episódica que me faz lembrar do quanto a finitude me angustia.

Amanhã, mesmo que o sol não brilhe no céu, vou fazê-lo brilhante aos meus olhos míopes.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

O jogo do risco

Outro dia, durante a minha aula de espanhol, o professor me perguntou: “?Tu eres afortunada?” Respondi que sim. Claro que sou. Não o tempo todo, mas até acho que na maior parte do tempo em que me é dado tempo para pensar nisso. Porque a pressão do ser feliz é fardo também. Sei que fui e sou, mas muitas vezes não fui e não sou. Pelo menos se interpretar tudo isso à luz do delirante mundo do "home sweet home" ou do “para sempre”.
É preciso ter coragem para não ser feliz. E audácia, ousadia, desprendimento. Não quero me amedrontar diante da dor porque ela é fermento e razão para o meu crescimento. Fui infeliz hoje em vários momentos. Mas um sorriso me fez muito feliz. Sem romantismos idílicos. Apenas sentimento. Me impressiona um pouco o medo do risco apenas pelo risco da dor que isso me trará.

Se o risco é inerente ao jogo, quero jogar e me jogar por inteira. Se o joelho ralar, se a lágrima escorrer, se a chuva cair, se a noite chegar...que seja bem-vinda. Porque no dia seguinte vou jogar novamente. Quem quiser que entre no time...ou assista da arquibancada.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Algo que é divino

Dias de sol e céu azul são bençãos divinas. Me fazem um bem imenso. Parece que sou capaz de respirar o ar mais puro e com ele me purificar, eliminar as toxinas dos pensamentos tortos, destilar a fonte do devaneio momentâneo.
Se esse cenário ainda incluir o mar,...só para olhar, só para sentir o cheiro, só para ouvir o barulho das ondas...aí sim posso dizer do reconhecimento de Deus na minha vida.
Li uma crônica da Marta Medeiros falando sobre a forma como ela entende a presença de Deus em sua vida. Enquanto lia pensei sobre o meu conforto d´alma quando diante de momentos de delicioso prazer - segundos, às vezes - posso sentir-me próxima da idéia de um olhar afetuoso e divino sobre mim.
Já falei aqui no blog sobre encantamento. E acho mesmo que essa alegoria do encanto mágico me faz compreender ou tornar palpável essa relação com a energia divina, absolutamente fraterna e generosa. Vivo isso nos momentos em que as manifestações de amor me cercam, que os filhos me enternecem, que a bondade intrínseca de alguém me entusiasma, que a palavra serena é a gota que falta para adoçar a dor, que o sol e o céu azul brilham na minha vida.
Acho que reconheço Deus nesses momentos.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Interlúdio

Nem toco nas paredes.
Me esgueiro entre os corredores e as palavras,
entre os gestos e os olhares.
Qualquer centelha pode fazer fogo.

Nem quero me ferir.
Me escondo atrás da porta,
entre bolsas e sapatos em desuso.
Falo pouco, lembro menos.

Qualquer movimento pode acelerar o tempo.
Um tempo em que eu não era criança
e nem podia temer o vindouro.

Piso devagar, nem faço barulho.
Adio a vida, o toque, o susto, o riso e a dor.
Ninguém me percebe atravessando a rua.

Esperto disfarce de fada, maga ladina a brincar de esconde.
Lá na frente é hora do banho, do sono.
Talvez eu nem durma.
E então abra os olhos

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Minhas teorias sobre amor e encantamento

Das coisas que ouvi ontem, uma das que mais me fez pensar foi sobre o desafio que proponho da permanência do encantamento. Gosto mesmo de manter as relações pessoais no limiar gostoso da sedução porque isso faz bem para mim, me alimenta, exercita minha capacidade de conquistar e, principalmente, de fazer a manutenção dessa conquista. Parece cartersiano demais, não é? E até ouvi isso ontem também. Tenho um lado bem prático, que não raras vezes organiza o pensamento e até mesmo as emoções na direção de objetivos definidos. É claro que tudo é um jogo, que pode dar certo ou não, que posso vencer ou não e que sobre o qual é sempre possível a mudança de ritmo ou de direção. Mas do encantamento não posso abrir mão. Gosto demais desse estado latente que aquece minh´alma, aguça meus sentidos, estimula minha criatividade emocional na busca da percepção do outro sobre o meu encantamento ou, o que é melhor ainda, no envolvimento do outro nessa saborosa viagem da sintonia e do amor.
Não sei se os que me lêem acham tudo isso meio louco ou se, ao contrário, vão comigo concordar. Somos todos marionetes e manipuladores. E nem vejo nisso nada tão cruel. Na verdade, não gosto de viver histórias ou relações sobre as quais não tenho nenhum controle. Posso até perder um pouco as rédeas pelo caminho, quem sabe afrouxá-las ao sabor da deliciosa viagem, e até experimentar o fato de que minhas mãos não são tão fortes ou capazes de conter a fúria boa desse encantamento. Mas, sim, gosto de segurar a cordinha. Os que me descobrem e que por mim se encantam vão logo saber que também podem puxá-la, porque eu deixo, porque eu quero, porque eu gosto. Não há usurpação no amor de verdade. Só encantamento.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Personagens

Já fui tantas pessoas por aqui e todas se fizeram voz através de minhas letras. Bem ou mal escritas, todas tiveram vez. Não sou cruel com elas, personagens que carrego e que vão se revezando em eventuais apresentações. Seja em circo mambembe do interior ou na gala grandiosa do imponente teatro. Sou tudo isso e é nesse grande mix de egos e almas que construo minha história.
Minha personagem de hoje perdeu-se de suas certezas e afundou na movediça areia da dúvida. Galhos e cordas cercam-me de oportunidades, mas dói pensar que tenho que escolher uma delas. Não queria decidir, apenas apontar. E somente a luz desse dedo mágico já iluminaria o cristalino caminho do que é melhor para mim.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Reconstruindo

Alguns acontecimentos me vulnerabilizam de forma tão preciosa que me sinto tentada a discuti-los incessantemente até que a zona do conforto novamente me permita o olhar racional. Gosto da idéia do encantamento e ainda que racionalize minhas emoções, não há nada mais prazeroso do que a harmonia eventualmente expressa entre o que sonhamos e o que vemos sonhar nos olhos dos que nos cercam. Penso sempre que isso vale para todas as nossas formas e expressões de amor, das íntimas às fraternais.
Já disse em algum post aí prá baixo do quanto me permito a idéia de que posso mudar o mundo, de que sou artífice da grande aventura de transformar, a mim e aos que me cercam. Não necessariamente para melhor, embora o objetivo - ainda que tortuoso - seja sempre esse. Mas nessa cruzada nada bíblica, as tormentas são infindas; as conquistas, gloriosas; e as decepções, nas raras vezes, épicas. Porque no meu sonho e na minha "vibe", muitos embarcam, mas também saltam antes do ponto final.
Esse é só o relato de uma decepção pessoal, expressa num acontecimento do meu cotidiano profissional e que, sem dúvida, me vulnerabilizou além do que posso, momentaneamente, compreender. Me sinto ingenuamente traída em propósitos sobre os quais só tenho o olhar nobre. Talvez o equívoco seja esse: preciso reconhecer que ao largo de meus sonhos estão os delírios; que eles talvez sejam apenas expressões do espírito humano errático; que faço parte desse mundo de desvios e falhas também; que se não tenho - e não tenho mesmo - o desejo alienante de formar um exército de iguais, as diferenças, surpresas e decepções fazem parte do jogo.
Não sou tão boazinha assim a ponto de engolir fácil as sensações de injustiça ou manipulação que experimento. Muito pelo contrário. E falar disso por aqui também me oferece a aspirina sanativa do desabafo. Não sou melhor e nem pior que ninguém. Não perder esse foco, essa ótica, certamente me ajudará na percepção de que nem sempre escolhemos o nosso caminho, mas podemos reconstrui-lo sempre. Acredito nisso. E hoje começo, mais uma vez, a reconstrução.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Lúcida, enfim!

Hoje acordei com a sensação de que dormi, fui abduzida e retornei com a clareza dos sábios. Nem sei se os que me lêem já viveram situação semelhante, mas não é incomum que comigo ocorra. Quando o buraco parece imenso e profundo, e a lama recobre minha alma e o corpo físico, um extraterrestre cristão e salvador me faz dormir e a abdução desperta-me absolutamente poderosa.
Lucidez. Essa é a palavra de hoje. Sinto-me de olhos abertos e acurados em direção aos múltiplos caminhos que se agigantam na minha frente. E essa sensação me é tão cara! Gosto de estar, ainda que movida pela emoção, racionalmente equilibrada, com o olhar agudo e amplo sobre os fatos e suas - ou minhas - dificuldades.
A lucidez me traz equilíbrio, ousadia na medida potencialmente certa, segurança diante do risco. É estrada que não conheço, mas domino. É poder. No substantivo, no adjetivo e no verbo. Conjugado em todos os modos e tempos.
Clareza e clarividência. Retiradas as interpretações esotéricas, é como se pudesse olhar o campo de batalha tal qual o general estrategista. Bem longe do front.
Hoje descobri - e talvez seja só hoje - como mexer as peças, transferir os exércitos, conquistar entradas e bandeiras, descobrir saídas secretas, desvendar os anagramas indecifráveis.
Deliciosa sensação que me fortalece, que me devolve ao Shangri-lá - efêmero que seja - dos dias de sol e céu azul. Até faço graça, sem contar os bons negócios que a clareza - generosa e sem restrição à ação capitalista - me proporciona.
Estou leve e criativa. Nem preciso traduzir esse bem em textos, mas as palavras e as vastas emoções fraseiam meu caminho. E me fazem melhor. Muito melhor.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Prá respirar

Sei que fugi de mim, de alguém que me surpreende e seduz, que me assusta e atrai, que me escraviza e liberta.
Sei onde estou escondida. As frestas e vielas permanecem violáveis, fugidias e fingidas, a expor a face que não mais se traveste. Mas fugi de mim, de alguém que me impõe a revolução, que atravessa as estradas e ignora o tráfego, que subverte a ordem e vai às ruas.
Barricadas incendiárias. Nem mais sei quem sou, mas ainda me trago à tona pra respirar, e me acalmar, me enganar, me perdoar. Nem tento explicar, nem quero. Fecho os olhos e os coquetéis molotov cruzam meus céus tal qual as traçantes balas da madrugada carioca.
Mas corro e escondo essa face que corrompe minha caminhada tranquila, que me impõe o trajeto tortuoso, entre pedras e declives. Sei que fugi de mim....mas já me entreguei há algum tempo.
Fui abduzida pelo encantamento e minha resistência goteja. Volto a pensar na imagem metaforizada que já não me abandona mais: o que posso fazer para conter esse mar?

terça-feira, 22 de julho de 2008

Tempo de moinhos

Quero lembrar de um tempo
entre o sim e o talvez,
onde construíamos castelos,
escutávamos moinhos,
plantávamos na terra
o verde inquietante.

Quero falar de um sonho
que criei com lucidez e delírio,
atropelando os designíos
em verbos e frases sem métrica.

Quero ver novamente teu sorriso,
nunca demasiado, sempre intenso,
a dizer-me de um tempo
entre o hoje e o amanhã.

Porque sempre é tempo..............não é mesmo?

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Ilações sobre o amor

Das várias ilações sobre o amor, gosto daquela que diz que nos apaixonamos pelo que reconhecemos de nós mesmos no outro. Talvez em doses mais equilibradas, talvez não. Mas é delicioso estar em sintonia de prazer e admiração com a resposta que vemos, com o olhar apenas e nem sempre com os ouvidos, no objeto de nossa paixão.
Curioso é perceber - e hoje vivi essa experiência - o quanto me fere e frustra ver - literalmente -ou reconhecer no outro o reflexo do que abomino em mim. Como as reações destrambelhadas e intempestivas, a ausência da razão, a agressividade desmedida, a mágoa revivida. Esse sentimento realmente me fere, me frustra, me faz reconhecer uma face que não me atrai ou apaixona.
O amor nos permite a interferência? A sacudidela emocional que leva o outro - ou a nós mesmos - de volta aos trilhos? A argumentação equilibrada quando os mares são de tempestade?
O amor nos permite dar feições eventualmente tragicômicas aos acontecimentos que rompem a métrica perfeita da paixão? Na verdade, acho que sim. Porque somos seres erráticos em busca de finais felizes, das paixões intermináveis, da profunda sintonia que preenche nosso corpo e alma. Sei do delírio de minhas blogueiras palavras mas, tal qual os poetas, sofro os sonhos e sonho o sofrimento.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Só porque experimentei....

Gosto de pensar em lugares para os quais desejo voltar sempre. Gosto de pensar em emoções que experimentei e que sempre penso retomar. Curioso como esse gostar nunca mais é igual, por mais prazer que ele te cause.
Tem lugares que conheci na vida e para os quais retornar é sempre um objetivo. Para alguns deles já retornei várias vezes e sempre relembrei, em outras cores e com outro olhar, o impacto que me causam. Sou carioca e não tem uma vez que atravesse o Túnel Rebouças e que não me tome do sentimento de êxtase que a visão da Lagoa Rodrigo de Freitas, descortinando-se aos meus olhos, me traz.
Amo voltar a Porto de Galinhas e embora a veja cada vez mais cidade grande, mais urbana, mais cheia de gente e lojas, sinto-me encantada diante daquele marzão absurdamente azul, em especial quando estamos próximos do meio dia. Voltaria a Paris todos os anos e ficaria novamente embasbacada diante da Champs-Élysées com o Arco do Triunfo ao fundo. Me sinto - essa é a verdade - premiada, como se desfrutar daquilo tudo fosse uma benção que me foi oferecida.
Adoro o clima praiano, simplório e, ao mesmo tempo, cosmopolita do norte da Espanha, especialmente da região da Galícia, onde meu pai vive. Tenho sempre a doce lembrança de estar sentada em um dos muitos bares da beira mar de Sanxenxo, uma cidadela absolutamente atraente.
Não abro mão nunca de um fim de tarde a caminho do Arpoador. E de um bom papo, de amigos, de bons vinhos e do ócio também. São sempre retratos dos meus momentos especiais, que retomo mas sempre experimento de forma diferente.
Pensei nisso hoje porque tenho experimentado deliciosas sensações de prazer com meus filhos. Prazer que já não mais se expressa apenas no doce e generoso carinho que trocamos, mas especialmente nos momentos em que os vejo felizes. Indescritível sensação. E por mais que esse sentimento também se revele de formas e dimensões diferentes, é bom demais.
Me sinto feliz e plena. E aí é inevitável: lembro de Paris, da Galícia, de Porto de Galinhas e do pôr-do-sol no Arpoador.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Brincando com as palavras

Quem sabe me transforme,
mude a roupa,
esqueça as máscaras,
apague do calendário os dias carnavalescos.

Quem sabe me pinte,
sorria inocentemente,
brinque de roda,
traga prá perto os duendes que adormecem no jardim.

Quem sabe corro e tropeço,
ralo o joelho,
torço o pé
e levanto com a força dos biotônicos vitamínicos.

Quem sabe digo não,
e faço birras,
enrugo a testa,
implicantemente ranzinza e boboca.

Quem sabe amadureço,
vire gente grande,
perca a pureza
e me tome das dores que desprezo.

Mas, quem sabe, perca o tino,
arranque o siso,
atravesse a estrada
e reconheça a entrada do parque.

Aí vou ser criança vestida de gente grande com joelho ralado e boboca abraçando duendes sorrindo inocentemente em dias de carnaval.

Tudo ao mesmo tempo agora!

quarta-feira, 2 de julho de 2008

A parcela da dor

Temos todos uma alma infeliz que, sem avisar, sorrateiramente se instala em nossas vidas como se a ela devêssemos parcelas da conta de viver? Crescer é sofrer? Amar é sofrer? Viver tem que necessariamente incluir a parcela do sofrimento?
Tenho lido tantos relatos ou olhares metaforizados sobre as dores da alma que já faz algum tempo pensei em escrever sobre isto. Nossa mente é o paraíso e o inferno. Nos faz artífices do prazer e escravos da dor de nos sabermos fracos diante do que nos faz sofrer. E sofro por amar demais, por desamar, por me sentir só ainda que cercada de gente, por querer estar só quando cercada de gente, por sentir-me sem alternativas, por ter que escolher uma entre várias, por seguir caminhos tortuosos, por entortar-me para fazer emocionalmente o caminho tranquilo.
E sofro mais ainda porque sou capaz de olhar racionalmente a dor. Engraçado isso. Nunca me dei conta da crueza desse olhar racional e analítico sobre minhas próprias emoções. E minha amiga mais amiga me disse isso outro dia. Foi quando percebi e senti a clareza dessa afirmação. Sou emocionalmente capaz de olhar a dor de dentro e de fora.Sou fogueira com a mangueira de água na mão.
Sou forte. Sei que sou. Posso tudo porque racionalmente compreendo o tudo. Um tudo, às vezes, tão pequeno. Sou fraca. Sei que sou. Porque não posso tudo, embora emocionalmente o veja possível. Me revelo nessas letras, entre as vírgulas e parágrafos. Estou repleta - especialmente hoje - de parênteses e reticências. E tantas vezes só quero que alguém me dê a mão para atravessar a rua. Alguém que pode ser você, que está agora na calçada à espera de uma pequena ou grande mão, segura e audaciosa o suficiente para cruzar a avenida e te guiar.
As dores da alma não são exclusividade dos que escrevem, dos que falam, dos que riem, dos que choram. Elas pairam no ar tal qual os vírus, dilacerantes ou não. Também queria a vacina preventiva, o diagnóstico precoce.
Queria tantas coisas. Mas hoje só queria muito te ajudar. E fazer diferença.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Prá discutir a mesmice

A incrível capacidade humana de criar e transformar é frequentemente confrontada com a doença da mesmice. Por que é que temos todos – ou a grande maioria – de sermos os mesmos, repetindo os mesmos erros, vivendo os mesmos pré-conceitos, perpetuando comportamentos seculares e pensando da mesma forma que nossos antepassados ancestrais. É claro que tudo isso é um exagero superlativo. Não ignoro os fantásticos avanços comportamentais que nos empurraram para a contemporaneidade social do século XXI. Mas algumas idéias, quase dogmas, permanecem encravadas na expectativa que todos temos diante da cronologia de nossas vidas e das fases que devemos viver em todas elas.
Quero pensar um pouco sobre isso e ouvir também. Até porque estou meio que no centro desse furação de expectativas cronológicas. Sim, a linha do tempo me colocou naquele palco onde, ao termos filhos adultos, somos obrigados a pensar em somar à categoria de mãe um novo emblema: o de avó. E ao saberem que tenho um filho de 26 anos e já casado, a pergunta mais comum não é o que para mim é o mais importante. Queria que todos, em nome da gentileza ou da curiosidade, só quisessem saber se ele está feliz. Porque é isso que importa. Mas, de modo geral, a pergunta sempre soma um infalível ingrediente: "Ih...daqui a pouco vai ser vovó"; ou "Já é vovó?"; talvez " Está preparada para ser avó?".

Não...não sei se estou preparada para ser avó. Tem algum curso preparatório? Tenho a obrigação de conter dentre meus múltiplos sentimentos o desejo febril de ser avó? Sinceramente, vim ao mundo sem essa ferramenta. E isso não quer dizer que não queira, que abomine a idéia de sê-lo. Muito pelo contrário. Amo tanto meus filhos que certamente amarei todos os momentos em que eles estiverem felizes. E se ter filhos for para eles o que foi para mim, um momento de escolha e certeza incomparáveis, estarei aí ao lado, curtindo muito a chegada do rebento. Mas não carrego comigo o desejo prévio da perpetuação genealógica. Não acho que tenha chegado a uma fase da vida onde ser avó seja a minha única meta. Sou produtiva e assim ainda me imagino seguir por longo tempo. Portanto, o padrão clássico da avó cuidando dos netos nem mesmo combina comigo. E meus filhos sabem disso.
Tenho amigas casadas que optaram por não ter filhos. E embora tenha sido criada dentro de um ambiente familiar meio que conservador, onde ter filhos era a sequência natural da vida de homens e mulheres, fui também educada para ser independente, dona do meu próprio corpo, incluindo o nariz. E assim, dessa forma autonômica, conheci o mundo, as pessoas e a mim mesmo. Descobri erros e acertos, desenhei erros e acertos e continuo acertando e errando, tudo ao mesmo tempo e agora. E nessa grande sopa, a idéia de não ter filhos é hoje uma escolha que não me incomoda. Entendo de forma tão clara a opção de minhas amigas, ainda que cada uma tenha um caminho diferente para explicar esse não desejo.
Estamos construíndo um novo mundo a cada dia. E ser capaz de romper com a mesmice, com o comodismo do pensamento tacanho que não admite novas vertentes, novas cores, novos gestos é dar passos além. E diga-se: não vai aqui crítica alguma às mulheres que querem, sonham, vibram com a idéia de serem avós. Só não quero ser obrigada a querer ser ou a ter que desejar ser. Meu tempo cronológico está expresso nos meus gestos. E esses serão sempre generosos.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Porque amar dá trabalho

Não sou alguém a quem todos amem ou só teçam elogios. Carrego equívocos milenares, alguns que certamente vivi e repeti também em outras vidas. Sou voluntariosa, personalista, meio rebelde, meio insensata, teimosa e até obsessiva. Mas a minha versão combo dá de brinde alguns ingredientes que até atraem pessoas ao meu mundo. E a esses me dedico. Porque acho que dedicação é fundamental na expressão do amor. E ser dedicado nada tem de subserviência ou submissão. É entrega no limite do que é possível, do que é real porque pode e deve sempre ser transfigurado em gestos. De perdão, compreensão, decepção, frustração.....e não necessariamente nessa ordem.
É que amar dá um trabalho imenso. É preciso querer muito e sempre. Atravessar fortalezas, romper diques, investigar párocos, enfrentar dragões, conquistar a Ásia, a Oceania e mais 24 territórios. Pior mesmo é quando nesse ofício você procura a excelência. E eu, confesso, procuro sim. Quero o ISO-9001. Nem quero pensar em me doar pela metade.Se for pela metade é melhor não ser. Amar é coisa prá se fazer por inteiro. E quanto mais amo mais sei que não existem salvaguardas, áreas de escape ou indulgências. Porque as consequências desse amor e suas dores serão também e sempre intensas. Por isso é preciso querer de verdade o bem que o amor pode nos proporcionar. E engolir em seco, contar até mil, fazer personagens... E cultivar, aguar, replantar cotidianamente. Dá um trabalho imenso. É quase um Moysés abrindo o Mar Vermelho.
E embora sejamos frequentemente preguiçosos, não posso porque não quero permitir que o comodismo retire de mim a incrível capacidade de amar. E que me faça amendrontada diante do que o bem do amor pode me trazer.
Não vou desistir nunca de cultivar os meus amores. E de tratá-los bem, ainda que escorregando nos equívocos ancestrais que teimam em colocar-nos em lados opostos. Quero a dedicação messiânica e consciente porque ela - tenho certeza disso - é a minha melhor ferramenta.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Se

Se te faço luz, tenho a presença,
se te peço a mão, busco esperança,
se te olho os olhos, conheço a fé,
se te chamo em voz, quero vida,
se te lembro histórias, perco o medo
mas se te digo vem, transformo o mundo.


É essa certeza avassaladora que me move. Sempre.

terça-feira, 17 de junho de 2008

De volta à inspiração

Depois de alguns dias de alma nublada, me sinto novamente inspirada. Faz frio no Rio de Janeiro. O céu recoberto de nuvens. Mas a chuva que insistia em se manter sob meus olhos, desfez-se. Estou confiante e, mais uma vez, crédula. Em mim e nas inúmeras possibilidades que circundam o meu entorno. Essa é, sem dúvida, a melhor sensação. A de que posso, que quero, que vou buscar e tornar real.
Estou pensando em perdão, compreensão, afeto equilibradamente sereno. Sentimentos que me desadrenalizam, mas que gosto e preciso viver quando volto a subir a escada. É curiosa essa sensação do recomeçar. Não parei, não fechei os olhos, nem revi conceitos. Simplesmente adormeci minha energia. E hoje tive a nítida sensação de que voltei a despertar. Sem sustos, sem açodamento, mas sempre esperançosa. A literatura da auto-ajuda me incomoda, mas hoje me sinto dentro de um desses manuais do bom viver. Quase uma Revista Nova com suas infalíveis "dez lições para encontrar o homem de sua vida". Meio bobo, meio vazio, sem muita explicação empírica. Só sentimento, só sensação.
Sei que poderia falar horas sobre isso. Ou escrever, despreocupadamente. De um modo geral não faço rascunhos. Deixo sempre que a emoção flua. Quase sopro, meio brisa, lufada mediúnica que toma posse de mim. Quero muito o sorriso inteiro de meus filhos. A presença do amor, expressa em todas as suas formas e linguagens. Quero, só quero. E querer é sempre expor-se na vitrine. Que todos visitem a loja e peçam doses generosas do que tenho por lá.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Um dia para chorar

Hoje queria muito chorar,
mas nem sei como fazê-lo.
Acho que desaprendi
ou perdi na esquina da alma segura.
Mas que alma segura
o que nem se pode conter?
A seca das lágrimas desidratou meu corpo
e trouxe sede.
Quero chorar porque estou triste,
porque preciso da benção desse molhar
que irriga minha´alma
e filtra a dor.
Quero chorar porque tenho vontade,
porque choro por dentro
e preciso vazar o que me afoga.


Esse poema, quase prosa, é motivado pela perda trágica de um companheiro de trabalho. Hoje, ao ver tantas pessoas sob lágrimas, pensei o quanto me incomoda não conseguir expressar minha dor além da minha própria dor. Faz tempo que preciso chorar. Mas não quero viver a dor para reaprender a chorar.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Sonho

Eu creio em sonhos e penso mesmo que eles são, não raras vezes, sinalizações espirituais que não sou capaz de perceber conscientemente. Sei que para muita gente isso pode parecer delírio, mas realmente penso que somos um universo de possibilidades e, dentre elas, estão as que não posso e nem necessariamente quero explicar.
Assim sendo, creio em sonhos premonitórios expressos em situações ou mesmo interpretações do que vivo nesse mundo paralelo. E hoje, especialmente, sonhei com uma imagem que se repete quando sei que coisas boas vão acontecer. Estava num parque, sentada numa espreguiçadeira em frente a um lago. Fazia frio sob o céu em azul. Ao meu lado, ocasionalmente, minha amiga Kátia, doce figura e que, como eu ou mais do que eu, ama viajar e se oferecer o universo das possibilidades. Estávamos, a meu ver - ou talvez porque ame o lugar - no Jardin des Tulheries, em Paris. Mas não era o lugar que era importante e sim a sensação de paz, de plenitude, do silêncio quieto que nos fala todas as verdades. Como se naquele momento fôssemos o lastro que permitia o equilíbrio, a verdadeira harmonia entre todos os elementos da cena. Ou do sonho.
Me deu uma sensação de paz tão profunda que acordei com esse espírito. Paciente, revolucionário, crédulo e absolutamente harmônico. Sou melhor quando sou assim, não tenho dúvidas. Me faz bem acreditar que hoje vai ser um dia melhor que ontem, repleto de boas notícias, de amor e compaixão.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Prisão

E ao te ver fez-se o encanto,
misteriosa alquimia
que desafia os sábios
e entorpece a razão.

Mas que razão há nesse canto?
Se só a infinita harmonia
que explica o universo
e decifra meus códigos.

Que expõe descaradamente
o que goteja e escorre.
E não há dique salvador
que possa conter esse mar.

O som da tua alma
cruzou o meu caminho
e eu só estendi a mão
e segurei.

Há prisão mais libertadora?

terça-feira, 3 de junho de 2008

A alma adolescente que ainda mora em mim

Algum resquício da alma da adolescente que fui permanece em mim. Nem toda a maturidade e experiência impedem que, eventualmente, a limitação maniqueísta dos que acham que têm toda a verdade do mundo me tome de assalto. E aí, irrefletidamente, divido o mundo entre os bons e os maus. E, é claro, estou sempre do lado dos bons. E olhe que nem sou tão boazinha assim. Mas sempre acho que estou repleta das razões que justificam minhas atitudes. E me enraiveço, tomo-me de um sentimento de indignação como se o mundo em minha volta não conseguisse ver o que, aos meus olhos nublados, parece óbvio: tenho razão, queria um mundo de seguidores a reconhecer em mim a grandeza dos filósofos e a lucidez serena dos monges.
Mas não sou nada disso. E, na verdade, não quero nada disso. Quero o equilíbrio, a serenidade possível, a tranquila observação de que o mundo está muito além da redução maniqueísta que só vê dois caminhos: ou a terra firme ou o precipício.
Quando acerto meu prumo, seguro meu timão e sigo meu caminho, o vejo sob a ótica da reflexão. Destemperos ocasionais, mas sempre mais ou menos dentro da estrada. Hoje quero muito ser capaz do exercício do silêncio. Me expor menos, especialmente na face mais tresloucada. Ficar com uma raiva ensandecida, que só me traz sentimentos de injustiça, me faz só. E sem a companhia do que tenho de mais caro a mim. Eu mesmo.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Falando sobre sexo

Há pouco mais de uma semana escrevi para uma revista da indústria farmacêutica, cliente da empresa onde trabalho, um texto sobre a evolução do comportamento sexual feminino. O cliente produz, obviamente, anticoncepcionais e o texto não poderia fugir desse ícone que é a questão da libertação que mulheres e homens conquistaram a partir do surgimento da pílula e da desvinculação possível entre sexo e procriação.
Algumas das idéias que apresentei no texto gostaria que estivessem por aqui também. E, obviamente, abertas aos comentários de todos.
Somos resultados de uma seqüência ancestral de relacionamentos entre homens e mulheres e que geraram filhos. Portanto, procriar é o fundamento de nossa existência e, assim, nada mais adequado do que o esforço da ciência em pesquisar evolução e sexo. É evidente também que à ciência não poderia faltar a percepção de que se mulheres e homens usam o cérebro para pensar em sexo, as alterações corporais que o resultado dessa atividade podem originar são bem diferentes. Ou seja, mulheres gestam, contribuem para a preservação da espécie, povoam o mundo, mas também gostariam de viver integralmente os prazeres do sexo sem que a procriação viesse junta no mesmo pacote. Esta motivação está na origem das práticas contraceptivas. Porque na maioria das vezes a motivação para o sexo não se faz pela tentativa de procriação.
Quando nos voltamos às teorias iniciais sobre o comportamento sexual dos animais, vemos estudos científicos mostrando que os machos desenvolveram comportamentos sexuais competitivos, lutando entre si ou produzindo ornamentos corporais para ter acesso às fêmeas. Além disso, por causa da facilidade para produção de esperma e a pouca ou nenhuma responsabilidade parental, machos de muitas espécies tinham pouco a perder ao fertilizar muitas fêmeas, tendendo a um comportamento evolutivamente mais promíscuo. Fêmeas, por outro lado, ao invés de esperma, produziam um óvulo único, bem maior e custoso do ponto de vista biológico, passando por todas as dificuldades de uma gravidez e cuidando da cria até que ela tivesse alguma auto-suficiência. Mudamos muito até o dia de hoje? Sem dúvida. Homens e mulheres, em alguns casos por força da lei; em muitos outros por força de um novo modelo de educação e vida em sociedade, criaram compromisso com os filhos gerados através de suas vidas.
Mas vale observar que muitos desses aspectos são uma justificativa plausível para comportamentos que ainda hoje regulam a vida de homens e mulheres. E assim, com tanto investimento por causa da função de gestar, fêmeas de muitas espécies - humanas, inclusive - tendem a ser muito mais seletivas na escolha de seus parceiros e muitas delas preservam um comportamento mais monogâmico.
É claro que esses são estereótipos de machos e fêmeas que, embora nos chamem a atenção, não descrevem a realidade da sociedade moderna. Além disso, tais características não são exclusivas. A agressividade na escolha de parceiros, por exemplo, existe em muitas mulheres e nossos "homens modernos" cuidam muito bem dos filhos, enquanto morrem de medo de "pular a cerca" ou pelo menos serem pegos nessa tarefa.

A disseminação da democracia moderna e as intervenções da tecnologia, como as ferramentas de mídia, resultaram na formação de uma cultura global moderna. O comportamento de "macho dominante" foi a regra durante muitos séculos de nossa história. E embora tal padrão ainda encontre semelhança em certas sociedades ditatoriais atuais, a grande revolução sexual dos últimos trinta anos é exatamente a que constrói um novo perfil de homens e mulheres, ou seja, machos não mais dominantes e mulheres não mais dominadas. E assim, menos comprometidos com um padrão aprisionador de comportamento, e entendendo que se o grande órgão sexual de homens e mulheres é realmente o cérebro, pensar em sexo é pensar em prazer e em formas de torná-lo mais reconfortante e seguro.
A disponibilidade da pílula anticoncepcional nas últimas décadas quebrou o paradigma entre sexo e gravidez, destruindo mitos e crenças sociais existentes por milênios. A existência da pílula contraceptiva fez com que o sexo passasse a ser buscado apenas por prazer, sendo o planejamento dos filhos uma escolha individual para o momento exato. Mulheres podem evitar relacionamentos prolongados pelo tempo que desejarem e enquanto conseguirem atrair parceiros interessantes.
Alguns pesquisadores mostram que esse comportamento gerou a existência de um sistema social relevante, particularmente em grandes cidades, onde pessoas podem "provar antes de comprar" tudo o que quiserem, e assim podem buscar o parceiro mais compatível e avaliar se querem ou não iniciar uma família. Pode parecer um tanto grotesco à primeira vista, mas o que realmente a pílula anticoncepcional ofereceu - e nesse caso, especialmente à mulher - foi a possibilidade de conhecer parceiros, sexualmente inclusive, e sem necessariamente a idéia de cada um fosse um potencial marido. E isso não quer dizer que mulheres, mesmo diante da emancipação social e financeira, não estejam em busca de um relacionamento maduro e comprometido e que disto origine uma relação familiar formal. A grande maioria busca o que é também uma vocação de nossa espécie: homens e mulheres gostam da vida juntos, até porque esse é um modelo ancestral que gostamos de ver repetido. E se procuramos alguém com quem nos identifiquemos social e culturalmente para formamos um novo grupo familiar, não podemos mais prescindir de um novo ingrediente de satisfação e seletividade: a afinidade sexual. Poder testá-la e usá-la como critério também de escolha de parceiros foi certamente a mais importante e revolucionária ferramenta de que homens e mulheres fizeram uso nos últimos anos. Mais ainda as mulheres, para quem a pílula é instrumento de libertação.

Assim, o comportamento sexual da mulher hoje é nada mais do que a prova de tanto quanto vocacionados para o sexo, homens e mulheres são vocacionados para a evolução. Não reconhecer isso é fechar os olhos para as nossas múltiplas possibilidades. No sexo, inclusive.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Um vento

O vento soprou meu rosto
e por um instante senti teu cheiro.
Lascívia sensação que te traz de volta
e mais uma vez me cobre como onda,
inunda minha´alma,
descarrila meu percurso.

E parecia tão real, tão perto,
até peguei tua mão e respirei teu hálito.
Memória de um gosto que não consigo desgostar,
que meu corpo não digere,
minha pele não esquece,
queima meu sono insone.

Lembrei teu jeito, teus sons,
meus sinais marcados a fogo na sua história.
Reconheci teu olhar, percebi os sinais,
impressões expressas que perdi dentro de mim
e sei como encontrar.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Falando de medos

Não sou uma pessoa medrosa, mas é evidente que tenho medos. De barata, então....desesperadamente. Medo de que aconteça algo ruim com meus filhos, de que minha mãe me falte, de perder quem amo. É claro que temo por minha saúde, segurança, patrimônio....mas além das questões da alma e do coração, só a barata me desestabiliza. Por isso tenho uma grande dificuldade em entender o pavor com que algumas pessoas interpretam situações ou acontecimentos em suas vidas.
Minha filha adquiriu um medo enorme de viajar de avião e isso tem atrapalhado em muito sua vida, profissional inclusive. E é algo tão intenso que não posso me abster de pensar sobre o tema. Ela sofre; eu sofro também. Tento argumentar com todas as questões e explicações sobre a plausibilidade de eventos relacionados à aviação, dados estatísticos, interpretações cartesianas, mas nada parece ser maior do que o pavor que a impede de compreender a razão de minhas justificativas. E o contrário é verdadeiro também. A terapia é o caminho para enfrentar esse monstro tortuoso e descobrir formas de engavetar ou administrar os temores que nos tomam de assalto.
Mas de onde essas coisas vêm? Como explicar concretamente uma sensação aterrorizante que não se fundamenta em algo palpável. Sim, acidentes aéreos costumam ser fatais. Mas fatal é a epidemia da dengue, são as balas traçantes que iluminam as noites cariocas, é o trânsito caótico diante da irresponsabilidade dos humanos. E tem os que sofrem do pavor de falar em público, dos ambientes cheios, de mergulhar no mar, de entrar em túneis, de montanha-russa, de qualquer altura, de ser observado, até de amar e não ser amado.
Quando nosso olhar é só de voyeur, de quem acompanha e sofre junto mas não tem dor é muito difícil. E quero ser condescendente, ajudar, dar colo e compreensão. Às vezes nem sei como.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Prá não levar a sério

Hoje acordei pensando em escrever alguma coisa no blog sobre a idéia de levar-se ou não a sério. Ou pelo menos muito à sério. Conversei sobre isso ontem. Na verdade, disse para uma amiga muito querida o quanto sabia ter sido ela um instrumento importante nessa minha grande e recente conquista pessoal: estou aprendendo a não levar tudo tão a sério.
Sou capaz até de rir das minhas mais patéticas fraquezas. Desapropriei o terreno seguro das minhas verdades intocáveis. E isso tem me feito menos comprometida com uma rigidez aprisionadora.
Não posso dizer que ousei tanto. Ainda carrego o peso daquele desenho de alguém a quem não é dado o direito de falhar. Mas tenho exposto tanto minhas dores, dúvidas e de uma forma tão mais bem humorada que - acho - deixei de lado o ranço das atitudes sérias. Porque séria, nesse caso, não é estar comprometida com algo que se acredita certo, mas sim não compreender que fazer de forma mais relaxada, menos dogmática, mais liberta de pré-conceitos é muito melhor.
Desencanei de uma série de coisas. E até acho chato gente que leva tudo muito a sério. Valorizo quem tem um olhar mais bem humorado, às vezes até docemente irresponsável. Adoro as incoerências e as surpresas que elas me trazem. É inspirador conviver com cabeças tresloucadas. Do bem, é claro, mas tresloucadas. Gente que pira, que chora, que ri, que vislumbra e admira. Tudo sem medida certa porque prá essa receita dar certo, só com generosas colheradas de desatino.
Não...não desatinei. Mas as bobagens hoje me são bem-vindas. Porque fazem parte de mim, um ser errático a garimpar tesouros onde brotam pedras e flores. Não necessariamente nessa ordem.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Para os amigos de verdade

Outro dia, lendo um dos muitos blogs que visito, nem sempre diariamente, mas em freqüência prá lá de intensa, o tema falava de amigos. E li porque gosto do estilo de escrever da dona do blog, porque me sinto curiosamente injusta se começo a ler e não dou a chance ao autor de me convencer de fazê-lo até o final, e basicamente porque esse é um tema que me atrai.
A idéia do grande amor expresso nas grandes amizades me seduz completamente. Acho que um amor descompromissado das pequenas ranhuras – e dos infinitos prazeres – da comunhão sexual pode ser tão intenso quanto qualquer ensandecida paixão. E tal qual a ebulição incontrolável que nos invade quando nos apaixonamos, perceber em alguém a infinita sintonia que explica, nem sei se mediunicamente, o amor por um amigo é sempre deliciosa experiência.
Tenho grandes amigos, mais ou menos recentes, mais ou menos freqüentes, mais ou menos próximos. Acho até que tenho histórias cármicas com alguns, para quem sequer me revelo porque já me vi em seus olhos e isso será sempre a mais profunda revelação.
Tenho filhos e para quem não os têm é difícil compreender a imensidão de um amor incondicional. Mas que também é responsável, formador, parametrizador. Portanto, comprometido. Embora único.
O amor amigo é sem conta conjunta, não emite fatura, não incorpora a fraternidade das relações longas. É só a certeza de um ouvir sem análise ou pelo menos sem julgamento. Talvez só argumentação, reflexão, choro e riso em generosas doses. É o olhar que observa e pondera; que sugere e aponta; que diz da forma mais condescendente e protetora. Porque não é preciso tocar na parte frágil; não é preciso incomodar. Só ficar por perto, só fazer-se perto.
Amigo mesmo é assim. E muitos dos meus vão se reconhecer nessas linhas blogueiras.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Das formas de amar

Daquilo que sei por vezes esqueço
e me perco e confundo entre ondas e marés.
Mas do amor sou escrava
porque do bem que me traz jamais me liberto.

Solto as amarras e desprendo o balão,
não quero vôo perfeito nem mesmo sereno.
Mas do amor sou escrava
e me encontro e revelo em cada susto ou sorriso.

E durmo o sono fértil da imaginação,
fantasio o romance mais tórrido e sufocante.
Mas do amor sou escrava
em todo o tempo que me é dado sonhar.

Vesti minha roupa de festa, pintei meus olhos de preto
e nem lembrei de dizer.
Mas do amor fui escrava.

Agora só falta você.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Prá mudar o mundo

Os que me conhecem já ouviram falar disso. Sou do tipo que acredita realmente que é possível mudar o mundo. Eu posso mudar o mundo e não desisto dessa idéia.
Ideologias à parte, acho que somos agentes de transformação e que não recebemos a benção de um cérebro tão sofisticado apenas para andar, falar, interagir, envelhecer e morrer. Quero mais! Muito mais! E na parte que me cabe, não posso prescindir da força inequívoca de meus atos e palavras - e não só os meus, mas o de todos - no objetivo de fazê-los instrumentos de interferência e argumentação.
Acho que posso mudar cabeças tacanhas, fazendo-as apenas observar além dos antolhos que por vezes colocamos em nós mesmos. Quero romper com práticas que minimalizam a nossa capacidade de raciocinar, impondo modelos repetidos e que, de maneira geral, sempre nos frustram. Busco e distribuo palavras de afeto - às vezes nem tão afetuosas assim - porque fazer alguém confiante é o primeiro passo para fazê-lo acreditar que sonhar é mais do que dormir e metaforizar no subconsciente. Não raras vezes estou na contramão da história, batendo de frente com quem alimenta o imobilismo, aprisionado aos grilhões de uma vida metodicamente ditatorial.
É claro que muitas vezes também não estou fazendo nada disso e preciso me despertar para voltar a acreditar que posso mudar o mundo, que sou responsável pelo o que me incomoda e que para desestabilizar as zonas de conforto é necessário enfrentar os recuos que o medo da mudança nos impõe.
Não quero desistir disso, de acreditar nisso. Não quero me render ao imobilismo. Não quero ficar somente pragmática. Porque sem emoção não há como mudar o mundo. Somos cavaleiros errantes a crer em moinhos. E nem acho tudo isso um delírio. Não posso passar essa experiência de vida sem usar as mil e uma utilidades de meu cinto de Batman.
Se isso tem ônus? Muitos. Às vezes, quase impagáveis. Mas já faz tempo que escolhi não esmorecer. Quando acho que não vou agüentar, fecho a porta e choro. E amargo o luto. Mas no dia seguinte volto à normalidade. O que não quer dizer que tudo isso seja o normal. Nem sei se é. Mas quando ainda estudante universitária aprendi a frase que guia a minha vida: quem não atua, compactua.
Dá prá perceber que gosto da adrenalina, não?

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Febre medieval da execração

Sou jornalista e vivo da indagação e da informação. Como leitora quero conhecer os fatos e suas repercussões. Como redatora, quero apresentar os fatos e até argumentar suas intercorrências. Mas não tenho a febre medieval dos que transformam pessoas em condenados à execração pública. Abomino a idéia da utilização de um veículo poderoso de informação, seja a televisão, o jornal impresso ou a internet para esmiuçar a vida de alguém, não mais importando o fato jornalístico e sim a idéia de que a humilhação, a exposição de alguém ao ridículo é a base da minha profissão.
Não gosto de intromissão na vida alheia. Nem mesmo na de meus filhos. Posso ter - e é óbvio que tenho - curiosidade. E que até entro em sites para olhar fotos de festas de "celebridades". Mas até aí querer, tal qual um urubu carniceiro e famélico, conhecer todos os aspectos que submetem as pessoas ao escárnio....tô fora! Isso vale para essa super mega exposição dos temas que nos perseguem como Ronaldo e travestis, Isabela e seus partners, os porres de Amy Winehouse e tantos outros.
É só um desafabo. Aberto, obviamente, às opiniões contrárias.

domingo, 4 de maio de 2008

Mergulho

Fui feliz quando te vi e me impedi de escutar os sinais que já falavam do mergulho sem volta.
Alertas vibrantes de mil decibéis, ensurdecendo minh´alma e me contando mentiras.
Diziam do risco do passo além, queimavam meus pés, crucificavam meu corpo à cruz do arrependimento.
Eram monstros assustadores a lembrar do preço, do ônus, do risco da paixão que turva a lucidez e suicida a razão.
Milhares de gnomos fabulescos a contar de dores, tropeços, trevas tsunâmicas.
Pensei tanto. Segundos intermináveis. Uma travessia desértica em meio às tempestades que inundam a caixa mágica dos sonhos e quebram a métrica da esperança.
Nem sei como sobrevivi. Mas o fiz, tal qual guerreiro tuaregue. E mergulhei.
Estou em pleno vôo.....ao sabor do vento que me carrega para um itinerário que escolhi...mas que desconheço....e nem sei se há pouso certo.
Mas fui tão feliz quando saltei.
Nem penso mais na chegada. Ou minto. É claro que a quero tão generosa e avassaladora. Mas o mergulho será sempre inesquecível.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Papo sem começo e sem fim

Sou alma e corpo no limiar da paixão. Estou sempre em estado de latência. Quase água fervendo, embora isso não queira dizer destempero. Nem sou assim tão descontrolada. Ao contrário, penso prá caramba. Tenho lido alguns textos em blogs que confirmam os efeitos desse vírus poderoso chamado incontinência mental. Gente que como eu não pára de pensar nunca. Sempre acho que devo um dia me meter num desses retiros espirituais para o exercício do silêncio. Vou pirar, certamente.
Mesmo quando leve e desencanada, meu envolvimento emocional se expressa nos pequenos sinais, no passo que nunca é fruto do acaso, embora o possa ser da razão. Discuto tudo sempre com torpor, embora calma, muitas vezes até irônicamente divertida. Confesso que faço assim até para não parecer uma doida desequilibrada. Embora até eventualmente o pareça, pelo menos aos olhares de alguns.
Isso é coisa de mulher? Será? Somos todas capricornianas eletrificadas? Não...sei que não. Leio blogs de gente de todo o tipo, e alma, e jeito que pensa igual. Está certo....defendo idéias e acho que vou mudar o mundo. Sempre penso que tenho argumentos tão ricos que sou capaz de fazer alguém pensar, embora isso possa definitivamente dar em nada. Mas tenho uma auto-confiança grandiosa. E sem interpretações metafóricas, acho realmente que posso porque quero e se meu querer não atropela ninguém, tenho direito de fazê-lo.
Isso tudo foi só para dizer que tenho me exposto demais. Não aqui, nesse democrático espaço, onde sou como sou. Ou até não sou sempre. Ou quem sabe muito de vez em quando. Mas alguma coisa sempre vai sobrar dessa alma quase vulcânica, de erupções instantâneas, eventualmente computadorizadas.
Mas tenho revelado fraquezas. Quanto mais escrevo aqui, mais me revelo. E ao me revelar, pego o gosto pela coisa. Estou especialmente sensível, do tipo que se fragiliza - embora nem sempre deixe transparecer - por acontecimentos, ou palavras, ou olhares tão desimportantes. Às vezes nem me reconheço. Ou só me surpreenda.
Será que precisei passar tantos anos para conhecer, pelo menos mais intimamente, essa criatura que habita em mim?

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Quero um dia

Um dia de loucura.

Preciso desesperadamente de um dia ensandecido que me permita a fantasia de alguém que posso ser sem consequências. Porque até aceito o ônus de decisões mal tomadas, de escolhas equivocadas, de caminhos tortos na direção do muro. As consequências, o dia seguinte, o olhar enviezado, o ter que explicar, justificar e defender é que me cansam. Ou me amedrontam.

Quero um dia sem convenções, sem preconceitos, sem dogmas ou manuais de sobrevivência. Onde possa me permitir os instintos em sua forma mais pura e certamente menos palatável. Fisiologicamente incontroláveis.

Quero um dia sem roteiro, sem compromisso, inteiramente disponível e hedonista. Um dia encantado, completamente nirvana, verdadeiro xanadu. Onde sonhos sejam sugestões bem aceitas. Somente os bons sonhos.

Quero um dia de amor. Sob todas as formas, cores, sabores. De prazer e sem aventura. Mas sem medo também. Sem montanha-russa ou bumg jump. Só desavergonhadamente à vontade. Um dia de sol, de mar, de corpos e areia.

Quero um dia sem depois. Só quem sabe, só talvez. Um dia sem certezas aprisionadoras, sem promessas definitivamente não cumpríveis. Um dia além. Nunca mas nem entretanto. Um dia para nem mesmo lembrar. Só viver.

sábado, 19 de abril de 2008

O beijo

O beijo marcou minha pele.
E desde então carrego comigo o novo sinal.

A ele recorro todas as vezes que penso lembrar,
que lembro pensar,
que quero sorrir e aquecer minh´alma com a ebulição daquela boca.

Fui abduzida, perdi o prumo, larguei o timão.
Voei sem autonomia,
nem sei pilotar.

Mas o beijo marcou minha pele,
corrompeu o tempo,
deixou pegadas.

Que delirantemente sigo...
e sigo...
nem sei se quero encontrar.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

As marcas que carregamos

Somos resultados do quê, afinal? De um destino pré-traçado, cristalizado nas entranhas de nossas escolhas e caminhos? Das experiências que vivemos e do bem ou mal que elas nos proporcionam? Das influências, cruéis ou generosas, que outras pessoas exercem sobre nós? Das marcas que os pais nos tatuam através da infância e das quais só reconhecemos os efeitos quando maduros para dizer não? Mas aí já é tão tarde.
Li um livro recentemente que fala sobre o tema. É Marcas de Nascença, de Nancy Huston, leitura visceral em alguns momentos. Tantas vezes dolorosa; outras reconfortante. Tenho pensado o quanto tudo o que fazemos, e pensamos, e até o que construímos através da vida formam uma delirante e irresponsável aventura. E irresponsável aí quer dizer simplesmente "sem limite, sem preparação, verdadeiramente inconsequente". Estamos em estado de dúvida permanente, a brigar com o que achamos que somos, escravizando os desejos aos olhos de um destino que um dia imaginamos traçar, impondo-nos cotidianamente decepções e desvios de rota, tropeçando em experiências frustrantes e seguindo em frente.
Temos filhos e os fazemos novos personagens dessa grande corredeira e sequer sabemos bem de que forma fazer para - lá na frente - não os tatuarmos com todas as dores e ausências e carências que trouxemos de nossos pais. Achamos que sabemos tudo e que o resultado será glorioso. Mas nem sempre dá certo. Ou nunca é assim. Happy-end sem dor, sem marca de nascença, só nas fábulas midiáticas.
Porque somos uma grande sopa psicodélica desequilibrada. Misturamos - com alguma ou dose alguma de livre arbítrio - fatos, tropeços e dores tatuados numa alquimia que nem mesmo os magos druidas seriam capazes de compreender. Ou equilibrar. Ou sequer repetir.
Não sou capaz de mensurar o mal ou bem que causei aos meus filhos e à vida que eles terão pela frente. Em que momento, adultos que são, eles lembrarão de mágoas e dores e ausências mal resolvidas. Quando olho com a condescendência e generosidade com as quais me permito julgar, acho que o estrago não foi tão grande. Outras vezes, sinto e sofro o peso insuportável da grande culpa que toda a mãe carrega. Porque as mães podem ser muito infelizes, sabiam? E pensar assim é, não raras vezes, oferecer-me a fonte luminosa do perdão.


Esse texto foi inspirado na dor às vezes tão pungente e sem conforto de Karla, amiga a quem quero bem demais. E, é claro, a quem não conforto o quanto gostaria. Porque, verdadeiramente, por mais monótono que isso pudesse ser, gostaria muito de ter todas as respostas para as dúvidas que lhe incomodam.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

A letra S

Adoro as palavras com a letra S. E há muito sempre ofereço aos amigos, no baú dos souvenirs, a trilogia clássica: sorte, saúde e sucesso.
Os "esses" são o sofisma sedutor da alma humana.
Somos todos sinuosos; serpenteamos através dos sortilégios da vida; sugerimos o nosso parco ou generoso saber; saltamos para dentro ou para fora ao sabor dos sustos; salpicamos nosso silêncio com sonhos sem noção.
Temos sede; jorramos sangue; somos sensíveis, selvagens e sagrados. Sabemos ser sagazes, sarcásticos e seguros. E até, sorrateiramente, praticamos alguma pequena ou grande sacanagem. Só para sorrir, só por suspeitar, só para surpreender.
E, convenhamos, sexo é bom. Com sabor e saudade, mais ainda.

Penso sempre nesse tema e hoje resolvi não me conter no desejo de descrevê-lo, por mais bobo que seja. E é.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Embriagados pelas palavras

Tenho lido tantos bons textos.... São blogs de gente que - como eu - se embriaga voluntariamente com doses generosas de palavras. Sem medo da exposição cirrótica da alma.
Já tive dias de alma amarga onde o lenitivo veio sob a forma de contos deliciosamente bem humorados. Já tive dias ensolarados onde poemas apaixonados me permitiram o espelho do que ouso sonhar. Já tive dias sem vontade alguma de escrever, querendo palavras distantes, em quarentena, sob o efeito de um vírus fatal. Dias onde esperei que os pensamentos estivessem amordaçados. Nesses momentos, pensamentos e devaneios criativos das páginas que visitei - cujos comentários em meu blog são um fácil código de identificação - foram doses profiláticas do bem que as letras equilibradamente somadas fazem ao meu nem sempre atento coração.
Curioso como até mesmo os amigos se liberam e se revelam através das palavras quando lhes é cedido um bom espaço entre a vírgula e o ponto final.

Que venham todos com suas dores e amores travestidos da emoção que é fazê-los texto.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Sob o sol do Rio

Hoje o sol brilha intensamente no Rio. Aquela coisa meio mágica que inspira os cariocas - e os que não são também - e que nos faz contemplar. Gosto demais dos dias assim. Mesmo nos dias tristes, sou solar e diurna. As mazelas da cidade ( e olhe que são muitas), as filas nos hospitais, esse mosquito multimídia, tudo parece menor quando sob o céu em azul desavergonhado e desvirginado. Aquele que rompe, com doçura mas rigidez, as janelas que, não raras vezes, fecham-se ao brilho de um novo e sedutor dia.
A luz do sol atravessa minha sala, reflete na tela do computador e me espelha. Me vejo em céu, em luz, em mar. Nessas horas amo muito minha cidade.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Sem emoção

Faço-me voz,
apenas voz.

Não vejo nada.
Cegos estão meus pensamentos,
recobertos pela névoa da manhã sem sol.

Sorrio ou choro sem emoção.
Sou fantoche,
mamulengo ao sabor de mãos que não me pertencem.

Lágrimas, tropeços, a bronca do chefe, o dedinho que teima em procurar o pé da mesa.
Nada me fere.
Flutuo sob uma capa entorpecente.

Amanhã eu acordo.
E penso.
E olho

Fica pr´amanhã.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Dragão e anjo

Dentro de mim mora um dragão. Do amor e da maldade. Tem múltiplas facetas. Sempre travestido de almas diversas. Já foi aprisionado, já foi liberto. Conheceu a alforria e a vassalagem. Arranhou paredes e invadiu o inexpugnável. No dia de hoje - talvez só hoje - ele é personagem adestrado. Escorrega de vez em quando. De quando em vez ignora a voz de comando. E urra, e solta labaredas, mas queima pouco... O extintor da minha consciência parece estar em alerta, a apontar seu jato na direção do fogo que teima em jorrar de meus poros.
Mas cuido bem dessa insana criatura. O quero bem perto de mim. Assim até posso imaginar que o controlo e domino. Ou lhe deixo bicho solto, sem rédeas ou controle, a passear entre meus sonhos e delírios, a infernizar meu conforto, a queimar minha sanidade, a dar de cara com a coragem do anjo que também mora em mim.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Sem bússola

Era só brincadeira.
Um jeito meio lúdico meio ingênuo de seduzir.

Pequenos sinais, gestos suaves,
disfarçados sorrisos, olhares machadianos,
palavras doces, viagem sem bússola.

E do pequeno mergulho
fêz-se onda taquicárdica

E foi-se o equilíbrio, o esconderijo.
Decifrei meu segredo.
Te devorei.

Nonsense

Na manhã de ontem, acordei.
E no breve hiato entre abrir os olhos e reconhecer onde estava......me perdi.

Dormi horas, dias, meses, anos....hibernei e desaprendi a pensar.
Esqueci os tempos passados na prisão da sensatez.
Vivi instintivamente, rompi diques, ignorei convenções, saltei além da linha do horizonte e descansei.

E dormi horas, dias, meses, anos.....e nem sonhei.
Travestida em um espírito liberto e transgressor.
A cruzar estradas curvas, sem limite de velocidade, sem placas, pedágios ou compromisso da linha retilínea e monocromática.

Lembro de fragmentos de sons, trechos de textos que li, de vozes longínquas e reconhecíveis.
Um mundo em preto e branco, um copião de Super 8, películas quadro a quadro, surpresas de uma história que contaram.
Ou será que narrei?

E dormi horas, dias, meses, anos....nem sei se morri.
Rosto lívido, maquiagem intocada, mãos sobre o peito e a serenidade dos que não têm mais o que contar.
Ou explicar. Ou convencer.

E quando tudo parecia prá sempre, o despertador tocou.
Vibrato chinfrim.
Já acho que sou mais criativa dormindo.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Aos que entram em nossas vidas...

Li hoje um texto enviado por uma amiga muito querida e que falava das pessoas que entram em nossas vidas e nos transformam. Pessoas que escolhemos ou nos escolhem...não sei bem a ordem ou a desordem dessa afirmação. Não sei nem mesmo o que existe de mágico, esotérico, espiritual, além da explicação cartesiana em tudo isso. Só sei que isso tem em mim uma significação real.

Através da vida conheci várias pessoas que me transformaram, ainda que apenas me permitindo ver, tal qual espelho, o que insistia em olhar com olhos cegos. Muitas outras tiveram influência direta nas minhas escolhas, nos meus caminhos, na maneira como passei a olhar a vida e suas múltiplas possibilidades. E parafraseando a linha inspiradora do texto que li, pessoas chegam às nossas vidas para nos fazer novas pessoas. Às vezes melhores, às vezes nem tanto. Mas novas e, eventualmente, surpreendentes pessoas.

É incrivelmente produtivo - e auto-perdoável - pensarmos em nós mesmos sob a luz da incoerência. Quero, sim, poder ser uma nova pessoa a cada dia. É libertador pensar que nos foi dada essa possibilidade, ainda que pelo olhar generoso do outro, d`aquele que nos transforma. Não quero dogmas, nem verdades absolutas e aprisionadoras. Quero ouvir - e já vivi essa experiência tantas vezes - a palavra que quebra minha cadeia atômica e me faz reconhecer uma luz, uma idéia, um comportamento, uma característica que quero trazer para mim.

Continuo conhecendo pessoas que me transformam, que injetam cimento novo em meus alicerces, que me fazem lembrar que posso e devo buscar sonhos, nem que seja só para sonhar juntos. E elas, sem dúvida, me fazem melhor a cada dia. Mais consciente até mesmo do que preciso fazer para amá-las em sua infinita dimensão.

Olhar cru...olhar doce

Quero o olhar cru, sem condescendência. Dos bons olhinhos já estou repleta. Especialmente dos meus, os quais me ofereço em generosas doses. Quero o confronto de idéias, quero a contestação, quero o amargor da palavra dita sem agressão, apenas com a dose certa do que quero e preciso ouvir. Até para reconhecer o quanto é bom o olhar doce e cuidadoso de quem me ama.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

O outro lado do muro

Há muito tempo escolhi acreditar. Diante dos prazeres ou da adversidade, optei por enfrentar. Mesmo quando desisti, o recuo me fez renovar. Não sei se o que faço é o melhor. Mas talvez me conforte imaginar que optei por ver o outro lado do muro. Se pulei sempre? Certamente não. Mas por muitas vezes não temi, e quando tive medo, escolhi a escada, opção segura mas também caminho. Não tenho porque desistir, não sei viver sem me imaginar mais à frente, ainda que o mais à frente seja o que está atrás de mim.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Românticos e brucutus

Adoro a idéia de um pensamento romãntico, mesmo quando - capricorniana que sou - vejo a vida de uma forma reta. E porque gosto de ideais, porque acredito que sonhar é o primeiro passo e porque acho que posso mudar o mundo, admiro almas românticas. Especialmente quando são almas do sexo masculino.
Homens - não todos, felizmente - são seres aprisionados por um conceito brucutu, onde emoções só devem ser vividas no gozo do prazer, na realização de um objetivo concreto ou, quando muito, na lúdica brincadeira dos filhos. Quando ouço, vejo ou leio homens que rompem com esse minimalismo de idéias, que se permitem à reflexão e ao pensamento desantolhado, tenho mais confiança em um caminho onde mulheres, como minha sonhadora filha, poderão usufruir de um homem que faz da alma e do coração utensílios fundamentais ao seu dia-a-dia. E sem pieguismo.
Que bom que fui capaz de também fazer um filho assim, que acredita que palavras e gestos são a expressão mais clara de um torpor apaixonado, que move montanhas e transforma o mundo. E não metaforicamente.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Sem título

Te olho e me vejo
Ou me vejo através do teu olhar,
que me espelha e denuncia,
sem pudor ou receio.

Te vejo e me dispo
Ou me entrego aos olhos serenos,
que me contemplam e perdoam,
sem custos ou dor.

Te dispo e me revelo
Ou me perco sob os olhos cegos,
que me desenham e retocam,
sem medo ou cuidado.

O tom professoral

Bem-vindo e abominável tom professoral! Sou vítima ou dele me aproveito? Tenho convicção de que não tenho a pretensão de saber as verdades do mundo, os caminhos, as rotas e desvios. Mas devo vestir muito bem esse personagem porque a ele sempre retorno, seja pelo livre arbítrio, seja pelo arbítrio dos que assim me olham. Talvez deva desistir de imaginar que culpas não tenho. Sou eu mesmo que construo essa imagem, por vezes tão amiga, em outras, fontes de incômodo e desprazer.
Não... não é verdade que eu seja alguém que possa explicar tudo, ou ter sempre uma palavra equilibrada sobre tudo.Talvez deva me permitir não ter o que dizer, o descompromisso, o conforto dos que não sabem. Do que ter que, não raras vezes, conviver com o olhar dos que imaginam sofrer a censura dos meus pensamentos, a interrogação do meu olhar. Às vezes penso o quão bom seria não ser olhada assim. E quem sabe permitir aos outros entender que também preciso de um olhar professoral, que analisa e ensina, que argumenta e sugere, que pensa comigo sobre minhas dúvidas e incertezas.
Acho que me sinto cansada de ser alguém a quem não é dado o direito de vestir a fantasia dos que querem mais ouvir do que falar, dos que não se comprometem com opiniões sobre tudo, dos que podem ser frágeis sem surpreender ao mundo.
Queria não achar que tenho sempre algo importante a dizer. Queria minimizar ou redesenhar meus pensamentos para talvez ser querida pelo que sou por inteiro, e não pela parte mais "perfeita" ou "palatável". Sou mais do que a equilibrada, a racional, a certinha, a boa profissional, a boa mãe, a quem tem um casamento legal.
A sensação de que essa outra parte não é visível é muito ruim. Ou então a culpa é minha mesmo.

sexta-feira, 28 de março de 2008

Vaidade

No filme Advogado do Diabo, uma frase conduz toda a história. " A vaidade é o pior dos pecados", dita pelo diabólico personagem de Al Pacino. Sempre achei que havia uma verdade imensa naquela expressão, porque sempre reconheci na vaidade um doce veneno. Encantador no primeiro instante, fonte e alimento de gloriosos momentos, mas duro, imensamente difícil na dolorosa hora de pagar.
Sou vaidosa, sim. Do que tenho como conteúdo, das espertas armas das quais faço uso, da posição que ocupo, do respeito e admiração que inspiro, até mesmo do amor que sou capaz de construir.
Claro que uso tudo isso como alimento da minha satisfação pessoal. Por outro lado, construo uma imagem de poder que me faz, talvez aos meus olhos cruéis e auto-exigentes, manipuladora. O ônus disso é mais doloroso e aprisionador do que o prazer engalanador do "sucesso" que a vaidade nos traz.
Confuso isso? Para mim, também. Mas se a vaidade me expõe, abrindo a todos o julgamento de um comportamento que eu insisto em mostrar, culpa minha. Que eu conviva com ele, aprenda com ele, seja capaz de avaliar o preço que isso custa e decidir não mais comprar. Ou pagar para ver.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Alguém especial

Todo mundo, em algum momento da vida, conheceu alguém especial. E especial numa dimensão maior do que aquela febre e torpor que sentimos diante da pessoa amada. Alguém a quem só a presença, a voz, a palavra nos faz acreditar que sonhar é possível. E, melhor: tornar o sonho um acontecimento real, muito mais fácil do que até supúnhamos.
Pessoalmente, associo as pessoas especiais a alguma coisa perto da plenitude. É claro que tal identificação tem a ver com a generosidade com a qual as vejo. Mas também exprime um sentimento de achá-las em um degrau acima. Não falo da escada da subserviência ou submissão. Mas sim de quem alcançou uma grandeza – mais uma vez ao meu olhar – do qual ainda me sinto distante – se é que algum dia alcançarei.
São pessoas que compreendem mais, perdoam mais, se mantém menos expostas ao vaivém dilacerante dos jogos emocionais. E respondem, às vezes com todo o equilíbrio e serenidade que parecem fugir de mim, às perguntas mais difíceis; vêem saída nas situações mais conflitantes, oferecem um novo e clarividente olhar sobre os teoremas mais complexos da alma da gente.
Certamente alguém, ao ler esse texto, até dirá: mas você é assim, Verônica. Ok...sinto-me assim, meio fada encantada, meio guru, muitas vezes. Até acho que posso ser especial para muita gente. O que não invalida que possa, que queira ver e reconhecer as pessoas que são especiais. E aí não posso não incluir minha amiga querida Jane nessa lista.
Voz doce, palavra serena, equilibradamente iluminada. Amiga mais que irmã.
Me puxa que eu topo subir esse degrau.

Olhos cegos

Me sinto só quando mesmo cercada de gente não consigo expressar minha voz. Não uma voz desenhada em sons, palavras ou lágrimas. Mas a voz de alguém que sei que sou e que se revela sem máscaras, mesmo diante de olhos cegos ao que não lhes convém.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Um homem caido na calçada

No caminho para o trabalho vi um homem caído na calçada. Parecia um mendigo, maltrapilho e sujo. Literalmente jogado sob a chuva fina que molha a cidade no dia de hoje. Bem no meio da calçada. Eu olhava a cena da rua, de dentro do carro. E as pessoas - e eu também -cruzando aquela via como se ali não houvesse um homem, caído na calçada, sob a chuva fina e inteiramente só. Abandonado até por si mesmo. Definitivamente entregue à indiferença de todos nós. O meu incômodo com a cena talvez ainda seja a esperança de que a brutalização da alma não me tenha tomado de assalto.

Destino e conforto

A cada dia, a cada passo que me leva adiante, mais me sinto envolvida e embalada por um destino. Completamente traçado, parcialmente descrito, tênuamente sugerido. Sinto cada vez mais a força mística de histórias que se cruzam, que me dirigem na direção da missão maior de doar-me. Esse desenho me aninha e conforta.

terça-feira, 25 de março de 2008

Me faz melhor...

Importante é sempre o que me faz melhor. E numa ótica completamente universal, fora dos meus conceitos pessoais e auto-perdoáveis.
Me faz melhor quem me ama e vê em mim o que nem sempre posso compreender ou perceber. Me faz melhor o que me inspira o instante tênue e bom do prazer.
Me faz melhor o que parece inatingível e que, ocasionalmente, se descortina ao meu olhar.
Me faz melhor quem me oferece a visão do que me escondo.
Me faz melhor acreditar que posso, mesmo quando a impotência é a única mão próxima.
Me faz melhor um dia de sol, sentir o luar, uma tarde sob a brisa, o abraços dos filhos, a compreensão do amor, a benção do raciocínio, a rapidez do instinto, o cheiro que reconheço, o sabor que traz lembranças, a certeza tão pequena e tão grande do amanhã.

Fragilidades e semelhanças

Tenho pensado sobre o peso, sobre a dor e o incômodo que as pequenas coisas, pequenos gestos, a palavra única e indivisível me causa. Me sinto forte diante das maiores dificuldades, das grandes dores, me forjo em inabalável confiança e poder como se tornasse real ou factível aqueles que – acho mesmo – moram dentro de mim: o anjo, o demônio e os super-heróis. No entanto, a fortaleza é de areia quando um olhar, um suspiro, um gesto, uma palavra faz de mim alguém absolutamente sensível, frágil, quase febril. É claro que sofro e me abalo com as grandes dores, diante do que se descortina como assustador, sem saída. Mas diante de situações assim sou surpreendentemente prática, objetiva, fria na medida suficiente para responder com equilíbrio. Diante da desimportância – porque talvez seja assim mesmo que eu veja quando não travestida da emoção – é que os fantasmas surgem. Assustadores e profundamente doloridos. A fazer despertar em mim o que já vi, que reconheço, mas que guardo nos pequenos compartimentos da alma e do coração. De vez em quando, abro a gaveta e eles saem fantasiados de mesquinhez, ciúme, insegurança, medo, arrependimento, desconfiança e outros personagens.
Ontem conversei sobre isso com minha melhor amiga, com quem às vezes pareço tanto e em tantas outras só nos é possível conjugar verbos em tempos distintos. Mas nesse aspecto somos absolutamente identificáveis. E ouvi-la é, em tantas vezes, escutar a mim mesmo.

Minha filha

Tenho vários amores.... Pessoas a quem daria um pedaço generoso da minha vida. Mas para os meus filhos eu sempre reservei a porção maior. A verdadeira incondicionalidade. Para minha filha, Ana Luiza, meu amor de hoje e sempre, me dou por inteiro, num misto de paixão, emoção, cumplicidade e.... eventuais conflitos. Porque nós somos assim. Sempre intensas, a construir nossa história em comum de uma forma definitiva, mas sem nenhum compromisso com a coerência. Porque somos novas mulheres a cada dia e estamos sempre dispostas a renovar nosso amor. Você é luz e força. Inspiração e carinho. Medo e esperança. Dúvidas e definições.Se há amor possível de ser contabilizado, então nossa conta conjunta tem limite ilimitado.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Desequilíbrio

Menos do que quero
Mais do que posso
Pouco para o espaço que ofereço
Muito para o que posso guardar

Espelho

Entender o outro através do nosso olhar, emoção, sentimentos.... É muito difícil ou quase sempre um caminho para surpresas e, por vezes, decepções. O outro não é espelho de mim e muito menos tem correspondência naquilo que acredito, admiro, almejo. Ao mesmo tempo, nosso olhar pode ser fonte de perdão e compreensão, dando ao outro uma dimensão e valor que nenhum outro olhar - nem mesmo o do próprio - pode oferecer.
Curioso como pode ser grande o abismo entre esse olhar que idealiza a resposta do outro e o que o outro realmente apontará como resposta. Tão grande que por vezes - e quando possível - é mais fácil pular. Não resolver, não explicar, não perguntar e não sofrer. Pular, simplesmente, deixando que os olhos que se cruzam harmonicamente possam ser a única razão dessa história em comum.

Declaração

Verdades incontestáveis: gosto de gente (e de cachorros, também) e de ser gostada por eles. Não me importo com os indiferentes. Talvez muito com os desafetos. Se é que os tenho. Mas devo ter, afinal nem boazinha eu sou. Mas para os que amo, amo muito sempre. Quem não entrou nessa lista não sabe o que está perdendo.