quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Interlúdio

Nem toco nas paredes.
Me esgueiro entre os corredores e as palavras,
entre os gestos e os olhares.
Qualquer centelha pode fazer fogo.

Nem quero me ferir.
Me escondo atrás da porta,
entre bolsas e sapatos em desuso.
Falo pouco, lembro menos.

Qualquer movimento pode acelerar o tempo.
Um tempo em que eu não era criança
e nem podia temer o vindouro.

Piso devagar, nem faço barulho.
Adio a vida, o toque, o susto, o riso e a dor.
Ninguém me percebe atravessando a rua.

Esperto disfarce de fada, maga ladina a brincar de esconde.
Lá na frente é hora do banho, do sono.
Talvez eu nem durma.
E então abra os olhos

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Minhas teorias sobre amor e encantamento

Das coisas que ouvi ontem, uma das que mais me fez pensar foi sobre o desafio que proponho da permanência do encantamento. Gosto mesmo de manter as relações pessoais no limiar gostoso da sedução porque isso faz bem para mim, me alimenta, exercita minha capacidade de conquistar e, principalmente, de fazer a manutenção dessa conquista. Parece cartersiano demais, não é? E até ouvi isso ontem também. Tenho um lado bem prático, que não raras vezes organiza o pensamento e até mesmo as emoções na direção de objetivos definidos. É claro que tudo é um jogo, que pode dar certo ou não, que posso vencer ou não e que sobre o qual é sempre possível a mudança de ritmo ou de direção. Mas do encantamento não posso abrir mão. Gosto demais desse estado latente que aquece minh´alma, aguça meus sentidos, estimula minha criatividade emocional na busca da percepção do outro sobre o meu encantamento ou, o que é melhor ainda, no envolvimento do outro nessa saborosa viagem da sintonia e do amor.
Não sei se os que me lêem acham tudo isso meio louco ou se, ao contrário, vão comigo concordar. Somos todos marionetes e manipuladores. E nem vejo nisso nada tão cruel. Na verdade, não gosto de viver histórias ou relações sobre as quais não tenho nenhum controle. Posso até perder um pouco as rédeas pelo caminho, quem sabe afrouxá-las ao sabor da deliciosa viagem, e até experimentar o fato de que minhas mãos não são tão fortes ou capazes de conter a fúria boa desse encantamento. Mas, sim, gosto de segurar a cordinha. Os que me descobrem e que por mim se encantam vão logo saber que também podem puxá-la, porque eu deixo, porque eu quero, porque eu gosto. Não há usurpação no amor de verdade. Só encantamento.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Personagens

Já fui tantas pessoas por aqui e todas se fizeram voz através de minhas letras. Bem ou mal escritas, todas tiveram vez. Não sou cruel com elas, personagens que carrego e que vão se revezando em eventuais apresentações. Seja em circo mambembe do interior ou na gala grandiosa do imponente teatro. Sou tudo isso e é nesse grande mix de egos e almas que construo minha história.
Minha personagem de hoje perdeu-se de suas certezas e afundou na movediça areia da dúvida. Galhos e cordas cercam-me de oportunidades, mas dói pensar que tenho que escolher uma delas. Não queria decidir, apenas apontar. E somente a luz desse dedo mágico já iluminaria o cristalino caminho do que é melhor para mim.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Reconstruindo

Alguns acontecimentos me vulnerabilizam de forma tão preciosa que me sinto tentada a discuti-los incessantemente até que a zona do conforto novamente me permita o olhar racional. Gosto da idéia do encantamento e ainda que racionalize minhas emoções, não há nada mais prazeroso do que a harmonia eventualmente expressa entre o que sonhamos e o que vemos sonhar nos olhos dos que nos cercam. Penso sempre que isso vale para todas as nossas formas e expressões de amor, das íntimas às fraternais.
Já disse em algum post aí prá baixo do quanto me permito a idéia de que posso mudar o mundo, de que sou artífice da grande aventura de transformar, a mim e aos que me cercam. Não necessariamente para melhor, embora o objetivo - ainda que tortuoso - seja sempre esse. Mas nessa cruzada nada bíblica, as tormentas são infindas; as conquistas, gloriosas; e as decepções, nas raras vezes, épicas. Porque no meu sonho e na minha "vibe", muitos embarcam, mas também saltam antes do ponto final.
Esse é só o relato de uma decepção pessoal, expressa num acontecimento do meu cotidiano profissional e que, sem dúvida, me vulnerabilizou além do que posso, momentaneamente, compreender. Me sinto ingenuamente traída em propósitos sobre os quais só tenho o olhar nobre. Talvez o equívoco seja esse: preciso reconhecer que ao largo de meus sonhos estão os delírios; que eles talvez sejam apenas expressões do espírito humano errático; que faço parte desse mundo de desvios e falhas também; que se não tenho - e não tenho mesmo - o desejo alienante de formar um exército de iguais, as diferenças, surpresas e decepções fazem parte do jogo.
Não sou tão boazinha assim a ponto de engolir fácil as sensações de injustiça ou manipulação que experimento. Muito pelo contrário. E falar disso por aqui também me oferece a aspirina sanativa do desabafo. Não sou melhor e nem pior que ninguém. Não perder esse foco, essa ótica, certamente me ajudará na percepção de que nem sempre escolhemos o nosso caminho, mas podemos reconstrui-lo sempre. Acredito nisso. E hoje começo, mais uma vez, a reconstrução.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Lúcida, enfim!

Hoje acordei com a sensação de que dormi, fui abduzida e retornei com a clareza dos sábios. Nem sei se os que me lêem já viveram situação semelhante, mas não é incomum que comigo ocorra. Quando o buraco parece imenso e profundo, e a lama recobre minha alma e o corpo físico, um extraterrestre cristão e salvador me faz dormir e a abdução desperta-me absolutamente poderosa.
Lucidez. Essa é a palavra de hoje. Sinto-me de olhos abertos e acurados em direção aos múltiplos caminhos que se agigantam na minha frente. E essa sensação me é tão cara! Gosto de estar, ainda que movida pela emoção, racionalmente equilibrada, com o olhar agudo e amplo sobre os fatos e suas - ou minhas - dificuldades.
A lucidez me traz equilíbrio, ousadia na medida potencialmente certa, segurança diante do risco. É estrada que não conheço, mas domino. É poder. No substantivo, no adjetivo e no verbo. Conjugado em todos os modos e tempos.
Clareza e clarividência. Retiradas as interpretações esotéricas, é como se pudesse olhar o campo de batalha tal qual o general estrategista. Bem longe do front.
Hoje descobri - e talvez seja só hoje - como mexer as peças, transferir os exércitos, conquistar entradas e bandeiras, descobrir saídas secretas, desvendar os anagramas indecifráveis.
Deliciosa sensação que me fortalece, que me devolve ao Shangri-lá - efêmero que seja - dos dias de sol e céu azul. Até faço graça, sem contar os bons negócios que a clareza - generosa e sem restrição à ação capitalista - me proporciona.
Estou leve e criativa. Nem preciso traduzir esse bem em textos, mas as palavras e as vastas emoções fraseiam meu caminho. E me fazem melhor. Muito melhor.